Há tempos que eu planejava ver Memória Tangerina e que por
alguma razão ainda não tinha visto. Podia ser aquela prova para a qual eu
precisava estudar, o projeto de monografia que eu precisava esboçar, gravações
e reuniões de grupo que eu tinha no meio da semana, decisões que eu tinha de
tomar...Enfim, ou seriam essas obrigações cotidianas ou seria um tranca-verso
qualquer que me impedia. A vida é cheia desses tranca-versos, e não é só para
se mudar de cômodo, não. Existem versos para nos fazer mudar qualquer coisa.
Tem aquele específico que é justamente pra nos fazer sair da nossa zona de
conforto, tomar a iniciativa e mudar aquilo que queremos em nossa vida. E é
esse que, na hora “h”, dá branco. Não porque não o saibamos, mas porque talvez,
inconscientemente, não queiramos saber, por medo do incerto- alguns chamarão
covardia outros simplesmente instinto de preservação. O filme do Dodô mostra
que essa passagem é necessária, e, para que ela ocorra muitas vezes precisamos
quebrar uns ovos e assassinar umas Clarices, pois se não não teríamos omeletes.
Se precisamos ser fortes para isso? Uma Giulia lá atrás teria respondido
convicta que sim. E é aí que Dodô, com um sorriso doce de quem sabe algum
segredo e espera que o descubramos por conta própria, e com a altivez de quem
está afiançado por um Tarkovsky, nos arrebata. Não, nos não precisamos ser
fortes. A fraqueza pode nos ser uma grande aliada. Fraqueza e flexibilidade são
atributos da vida. E é a nossa fraqueza, ao contrário do que diz o senso comum,
que muita das vezes nos diz “Vamos!”. É a nossa fraqueza que nos embala com
Caetano ou Pixies e nos fazer tomar as rédeas de nossas vidas. É a nossa
fraqueza que nos diz que nós não precisamos entender, precisamos sentir. Eu,
que desdenhava da minha própria fraqueza, agora aprendi a conviver com ela, e
hoje, posso dizer que lhe sou grata. Sou grata por todos os “Vamos!” quando
minha legenda dizia “Não vou”. Porque o que endureceu não pode vencer. E “Vamos!”
é a minha palavra favorita. Obrigada Tarkovsky, obrigada Dodô! Obrigada a todos
aqueles cuja sensibilidade dispensa legendas!
Uma pérola de texto. Tão sensível e bem escrito que nos estimula a ver Memória Tangerina. Parabéns, Giulia, você escreve muito bem e sua sensibilidade toca profundamente as pessoas.Fiquei comovida.
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