segunda-feira, 19 de abril de 2010

Exílio



". . . Deixarás tudo aquilo que te agrada
mais profundamente; é esta seta a tal
logo no arco do exílio disparada.

E provarás como é falto de sal
o pão d' outros, e como é dura estrada
subir e sair pelas escadas de outros."


Com essas palavras Cacciaguida profetiza a Dante seu exílio. Exílio de quê? Após traspassar as árduas e tortuosas estradas dos Condenados, provar do pão sem sal do Purgatório(já que não há tempero suficiente para que se possa ser rotulado por Bom ou Mau), ascender pelas divinas escadarias do Paraíso, poderia alguém ainda se sentir exilado?Há em mim uma vacância entre Eu e Mim. Sinto-me insossa como uma purgada. Ao sentir na carne a destemperança infernal, abruptamente me aproximo de mim. Lançada, caio de bruços. Sinto a febre de um encontro incestuoso. Um encontro a sangue vivo. Tenho medo da hemorragia incessante, de não voltar a mim. Que as plaquetas não deixem eu fugir furtivamente por estes poros. Esses poros que a espera pelo momento da coagulação estampou na minha pele. Sigo exilada, nessa ansiedade hemofílica, enquanto ele não coagula e me tece com fibra indivisível o Corpo e o Espírito. Esses polímeros que me grudam em coesão divina, sim, são o Paraíso.E então poderei ser Boa ou Má, ser condenada ou canonizada, nunca insossa, nunca pela metade.